Na revolução de 1930 ocorrida no Brasil, as forças armadas impediram a posse do presidente eleito Júlio Prestes e colocaram Getúlio Vargas como presidente provisório da república. A ascensão do governo interino de  Getúlio Vargas no Brasil  ocorreu durante a crise mundial de 1929, que desestruturou o mundo capitalista. Com a quebra da Bolsa de Valores de Nova York, os preços internacionais do café despencaram e causaram grandes prejuízos aos cafeicultores, afetando diretamente a economia brasileira que na época era sustentada pela produção e exportação do café. Com a queda do principal pilar econômico do país, a estrutura política de organização da sociedade também ruiu e foi aí que Getúlio Vargas, que era advogado e com visão política aguçada, conseguiu conquistar grande parte da sociedade.

Quando em 1937 eram esperadas as eleições brasileiras marcadas para janeiro de 1938, Getúlio Vargas, exatamente em 10 de novembro de 1937, deu um golpe de estado e tomou o poder, determinando o fechamento do Congresso Nacional. Ele outorgou uma nova Constituição que lhe conferia controle total do poder executivo e lhe  permitia nomear interventores para os Estados Federados com ampla autonomia para tomar decisões. Durante a Ditadura Vargas, os Partidos Políticos foram extintos, foram proibidos aos Estados Federados  possuir bandeiras ou outros símbolos estaduais, foi implementada a censura à imprensa e propaganda e iniciou-se a repressão ao comunismo amparado pela Lei de Segurança Nacional que impediu, a qualquer custo, movimentos revolucionários. Desde o início da Ditadura Vargas, houve grande repressão política e social, perseguição, deportação, exílio, torturas e assassinatos em todo o Brasil. Escritores como Monteiro Lobato, que discordava do domínio estrangeiro sobre o petróleo, foi preso e condenado em 1941. Jorge Amado, que discordava das políticas públicas, foi preso duas vezes, em 1936 e 1937, sob acusação de subversivo. Seus livros foram queimados em praça pública e ele foi exilado do país em 1948.

 

Enquanto este clima de terror e o autoritarismo imperavam no Brasil, alguns países se envolviam em conflitos que culminaram com o início da segunda guerra mundial. Em 1941 os Estados Unidos definitivamente entraram na guerra. De acordo com as anotações do Ditador Getúlio Vargas em seu diário pessoal: “Parece que os Americanos querem nos arrastar para a guerra…”, o que realmente era a realidade, visto que os Estados Unidos precisavam de contingentes, os chamados “Buchas de Canhão”, de  Látex para produção de borracha e de minério de ferro e aço, ou seja, precisavam  de matéria prima e mão de obra barata e obediente para assim manter e vencer a guerra. O Governo Americano pressionou bastante e chegou a ameaçar o Brasil com uma invasão do Nordeste  se não houvesse acordo sobre a instalação de bases militares no norte do país. Todavia não foi necessário, pois os Americanos ofereceram  um acordo que foi  denominado “Acordo de Washington”, que previa a construção de uma Usina Siderúrgica que pudesse fornecer ferro e aço para os Aliados e também estabelecia cooperação mútua com o Reino Unido, onde o Brasil receberia empréstimos e a ampliação da exportação de borracha e minérios. As negociações se prolongaram por todo o ano e ocorreram vários impasses e o governo Americano por intermédio do  Eximbank  só liberou o empréstimo de 20 milhões de dólares depois que o ditador fez um discurso a bordo do encouraçado “Minas Gerais” anunciando a adesão do Brasil ao grupo dos Aliados e definitivamente  entrando na Segunda Guerra Mundial.

 

Assim o projeto de desenvolvimento econômico que visava a industrialização no país foi iniciado e criada a Companhia Siderúrgica Nacional em Volta Redonda, no estado do Rio de Janeiro e depois a Companhia Vale do Rio Doce em Minas Gerais para impulsionar a exploração das riquezas minerais do subsolo e para garantir que ninguém pudesse  impedir a extração de minério em qualquer lugar no território brasileiro. Visto a existência de  um acordo assinado em tempos de guerra  com os Americanos e que tinha de ser cumprido o Ditador fez o Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, que dispõe sobre desapropriações por UTILIDADE PÚBLICA que determina no seu artigo 5º - CONSIDERAM-SE CASOS DE UTILIDADE PÚBLICA: item f) o aproveitamento industrial das minas e jazidas minerais….

 

Decreto-lei é um Decreto, emanado pelo poder executivo e não pelo poder legislativo, que tem força de lei. Este decreto-lei, empurrado pela goela abaixo por um DITADOR que tomou o poder por um Golpe de Estado que dissolveu o legislativo  no  país  há 80 anos,  impõe aos brasileiros, em caso deste ser proprietário do solo de algum imóvel urbano ou rural, cujo o subsolo possua algum minério para aproveitamento industrial, a sua perda por desapropriação.

Este Decreto-Lei, neste século, no ano de 2021, vai contra qualquer liberdade democrática, visto que não estamos em tempos de guerra e a mineração é explorada por Empresas do 2º Setor, portanto Empresas com fins lucrativos, que desde então vem explorando o subsolo amparados por este Decreto-lei que instituiu a mineração como de “Utilidade Pública”.

 

Porque será que até hoje este Decreto-lei está vigorando desta forma e nunca foi questionado? Ora meus amigos é lógico que os empresários do setor minerário nunca vão querer mudar esta situação, visto que se você é empresário do setor de Turismo, Agropecuário, Comercial ou outro qualquer você terá de comprar ou convencer o proprietário do imóvel que quer explorar, plantar ou exercer suas atividades, a vendê-lo, arrenda-lo ou ser sócio no projeto, mas se ele não quiser, terá de encontrar outro local por mais bonito ou adequado que este seja. Agora, se você for empresário do setor Minerário, você só terá de obter a Concessão de Lavra da “Agência Nacional de Mineração” do local onde está a jazida e caso o proprietário do solo não queira permitir a exploração do minério, tão pouco quer vender, arrendar ou ser seu sócio, basta requerer na Agência, de acordo com o Decreto nº 9.406 de 12 de junho de 2018, Subseção I - DA SERVIDÃO MINERAL E DA DESAPROPRIAÇÃO - no ART 41, a declaração de utilidade pública. Assim sendo o titular poderá requerer à ANM que emita declaração de Utilidade Pública para fins de instituição de servidão mineral ou de desapropriação do imóvel.

 

E vai mais além, este Decreto-Lei que diz ser a mineração de Utilidade Pública, coloca o meio ambiente em segundo plano dando prioridade a exploração minerária onde quer que ela se encontre ou seja, se o minério estiver no subsolo de uma Área de Preservação Permanente, Área de Proteção Ambiental, Unidade de Conservação ou até mesmo em áreas de nascentes, a mineradora irá no final conseguir destruir aquele ambiente para extrair o minério que lá está depositado. De acordo com a lei Nº 12.651, DE 25 DE MAIO DE 2012 que dispõe sobre a proteção da vegetação nativa, diz em seu artigo 3º que entende-se por “Utilidade Pública” entre outros, a Mineração e em seu artigo 8º diz que a intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública… e ainda com mais agravo o parágrafo 1º diz que a supressão de vegetação nativa protetora de nascentes, dunas e restingas somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública. Podemos aceitar, nos dias de hoje, que o ambiente em que  vivemos é menos útil para a qualidade de vida da população do que a exploração de minério?

 

Temos de conseguir retirar o texto “O APROVEITAMENTO INDUSTRIAL DAS MINAS E DAS JAZIDAS" do Artigo 5º item “f”  da qualidade de Utilidade Pública do DECRETO-LEI Nº 3.365 DE 21 DE JUNHO DE 1941. Não estamos em tempos de guerra tão pouco em regime ditatorial, somos uma sociedade  democrática e portanto temos direito de requerer a desconsideração de Utilidade Pública para a Mineração no Brasil, já que a carta magna de 1988 no seu  artigo 176 considera a mineração como de interesse nacional e que as riquezas minerais do país pertencem à União e não ao proprietário da terra onde elas se encontram. Assim sendo, o direito de desapropriação estará garantido em caráter estratégicos e  nos casos extremos, todavia dentro das normas legais e de direitos, mas  sendo considerada de  utilidade pública a mineração  vai contra os interesses sociais e ambientais inclusive os citados no seu artigo 225 da própria constituição Brasileira: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Devemos ter sempre em mente que o alto grau de desenvolvimento tecnológico e industrial de uma sociedade pode trazer conforto e bem-estar sob o ponto de vista de uma cultura; mas, por outro lado, pode não conter boas soluções para sua existência no que toca à ecologia e a sustentabilidade ambiental.

 

Precisamos conseguir 3 milhões de assinaturas de cidadãos brasileiros, eleitores que não  aceitam esta imposição da ditadura de 1930 e solicitar ao Congresso Nacional a mudança da lei. Não podemos deixar que as empresas mineradoras destruam o meio ambiente em nome do progresso, pois os minerais extraídos do subsolo não se renovam. Com a crescente demanda mundial por metais, certamente esta  atividade,  ao longo dos anos,  vai deixar sequelas que levarão a humanidade ao declínio com a perda dos ciclos naturais como a escassez da água,  da produção de alimentos e da qualidade de vida das populações. Um dos metais mais procurados para mineração atualmente é a bauxita para a produção de alumínio e o Brasil quer aumentar as exportações e a meta agora é a extração a qualquer custo. A segunda maior reserva de Bauxita do país está localizada na Zona da Mata de Minas Gerais, uma região  com mais de dois milhões de habitantes, distribuídos em 142 municípios  que ocupam uma área de  trinta e sete mil  quilômetros quadrados, cerca de seis por cento do Estado de Minas Gerais. A denominação desta mesorregião se dá pelo fato da vegetação predominante pertencer ao bioma Mata Atlântica, que atualmente abriga vários remanescentes florestais intactos, que tem relevante importância .para a manutenção do ciclo da água, visto que a função da bauxita no subsolo é exatamente absorver a água da chuva e distribuí-la ao lençol freático, assim favorecendo a produção de alimentos, que é a verdadeira identidade da Zona da Mata de Minas Gerais. Uma  das microrregiões pertencentes à Zona da Mata que será mais afetada com a mineração da bauxita é a do “Caparaó”,  que possui grande beleza natural, atrativos turísticos ecológicos, entre eles o Parque Nacional do Caparaó, Parque natural Sagui da Serra, Projeto Resgate de RPPNs e uma agricultura familiar consolidada em um terroir diferenciado, sendo uma das  principais regiões produtoras de cafés especiais do Brasil. Não podemos esquecer que este Decreto lei impera em todo o território Brasileiro e na Amazônia encontra-se a maior reserva de bauxita do Brasil Vamos impedir que a destruição causada pela mineração se alastre e acabe com o nosso patrimônio que é  dos brasileiros. Considero este o momento exato para que ocorra uma revisão no conceito de “Utilidade Pública” dada ao setor minerário em 1941 pelo então Ditador Getúlio Vargas.

 

Carlos Monteiro

Diretor Presidente da Fundação Vida e Meio Ambiente